quarta-feira, 22 de abril de 2015

Gêmeos do Mal ou como me tornei uma viciada em livros

Eu sou dominada pelos gêmeos do mal perfeccionismo e procrastinação. Junto com eles vem a tríade do amor (nops): culpa, angustia e ansiedade. Desde a mais tenra idade eu sempre preferi fazer qualquer coisa menos o que eu pre-ci-sa-va, porque se for pra fazer tem que ser perfeito. Logo, em 28 anos eu desenvolvi técnicas muito sofisticadas de procrastinação.

Quando criança só pensava em ser bandido ao invés de fazer os deveres de matemática eu lia quadrinhos de faroeste, atlas de geografia mundial desatualizados, livros didáticos mil, manual de informações sobre esquistossoma mansoni ou basicamente livros sobre tudo menos matemática. Minha mãe é professora e somos seis filhos, sempre tivemos muito material pra procrastinar muitos livros didáticos em casa.

Aos 10 anos eu descobri a biblioteca de Ourém e que eu podia pegar livros emprestados lá. Muito rapidamente a matemática foi trocada pelos quadrinhos do Zé Carioca, da turma da Mônica, do Pato Donald, Mickey a toda a turma da Disney, eu li até mesmo as histórias da barbie... depois eu passei para os clássicos da literatura brasileira e mundial. Eu me apaixonei pelo Jorge Amado, Machado de Assis e Nelida Piñon, entendi metade de Hamlet, entendi NADA de Objecto Quase (14 anos gente, malzaê). Só parei quando terminei o ensino médio e mudei pra Belém.
Lá pelos 13 energia elétrica e o mundo maravilhoso da televisão chegaram onde a gente morava pra competir com os livros, mas só funcionava entre 6 e 10 da noite, tinha bastante tempo pra leitura.

17 anos, morando com a minha avó. Eu passava pelos menos 4 horas seguidas estudando pro vestibular. Nas demais eu lia as revistas Cláudia (argh!), Isto é (blergh!)e Readest Digest (anh) pra não ter que continuar estudando. Olha o que educação formal faz com as pessoas! A televisão também era uma grande ferramenta de procrastinação.

Nos negros anos da graduação eu mal tinha tempo pra ler o textos das aulas, não sobrava muito pra procrastinar. Me tornei um tanto produtivista e comecei a fazer faxina sempre que não queria estudar, uma maravilha. Louca da limpeza total.
Durante o mestrado piorou. Rolava o combo da alegria: limpeza + leitura (majoritariamente HQs) + televisão + insônia = crise renal e ansiolíticos (porque não?).

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2014. Exeter. Já falei dos essays semanais e dos pesadelos. Os essays precisavam ser perfeitos. Criei uma nova forma de procrastinar: exercícios físicos. Eu corria, nadava, fazia yoga e breakdance. Alguns dias tinha yoga pela manhã, corrida e breakdance no final do dia. Decidi manter só o break 3 vezes por semana. Eventualmente faço yoga também. Incluí filmes, séries e textos de internet sobre política e feminismo na lista de i rather do than study/work.
Mas nas últimas semanas eu atingi o que acredito ser o ápice da procrastinação: estou aprendendo química pra evitar botânica. QUÍMICA! Eu vinha sendo bastante disciplinada. Três artigos por dia. Escrevendo diariamente por duas horas. E aí quando eu percebi estava desenhando a estrutura química do ácido silícico e checando no google se estava certo. Estava, by the way. E por quê? Porque eu deveria estar lendo sobre a fisiologia das plantas e o processo de formação de fitólitos (sim, é tão empolgante quanto parece). 

Agora que tô consciente que passei a vida estudando pra não estudar tá rolando uma inception de culpa que não sei aonde vai parar. Só pra vocês saberem o motivo, caso eu volte desse doutorado batendo menos das bolas do que antes.
Fiz alguns workshops sobre escrita acadêmica e recomendaram escrita livre pra limpar a mente. E acabei de ler um capítulo inteiro sobre morfologia de fitólitos. Tinha que parar e colocar todos esses pensamentos pra fora pra poder voltar a ler/escrever sobre plantas.


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